As histórias da colaboração com Mariano e Nazario Turpo, pai e filho, xamãs e lideranças políticas do povo Quíchua, das cercanias de Cusco, no Peru, estão no cerne desta obra de Marisol de la Cadena. Inspirada por pensadoras feministas, dos campos da antropologia e da filosofia das ciências, Marisol desenvolve um trabalho etnográfico que se tornou referência ao valorizar a tradução como possibilidade de encontro entre mundos que, embora conectados, permanecem distintos. Neste livro, somos apresentados a seres que excedem qualquer possível categorização como “humanos” ou “não humanos” – é o caso, por exemplo, de Ausangate, poderoso integrante da comunidade cosmopolítica dessa região andina, que é “muito mais” que uma montanha.
Marisol de la Cadena nos convoca a pensar o que significa levar a sério a agência de seres cujo modo de existência não chegamos necessariamente a compreender. Tal movimento modifica profundamente o modo como compreendemos a ação política e amplia o leque de alianças que podemos estabelecer para resistir e lutar contra os projetos exploratórios e extrativistas contemporâneos, as expressões mais ferozes doAntropoceno nas Américas.
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“Este livro de Marisol de la Cadena é a prova definitiva das potencialidades de uma etnografia engajada na descolonização do nosso pensamento, a partir do desafio colocado pela “diferença radical” que a vida dos povos extramodernos coloca para nossas possibilidades de compreensão.
Seres-terra (d)escreve o processo de determinação de um modo de existência muito além dos limites da vulgata cosmológica contemporânea. Modo que inclui, precisamente, o que eu chamaria de princípio do excesso, o “não somente” de Mariano Turpo – o princípio de irredução que exprime a conexão parcial e equívoca entre as ontologias indígena e estatal no mundo andino. E que se desdobra em conceitos igualmente instigantes: o acontecimento a-histórico; a identidade entre os Seres-terra e seus nomes; o modo sui generis do “ser-com”, a imbricação imanente, engendrada pela relação “em-ayllu”, dos runakuna e os tirakuna – palavras densas cuja tradução, em última análise, é o objeto assintoticamente alcançado por este livro magnífico.” Eduardo Viveiros de Castro.
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