Lutos e lutas, fotos e texto por Tuane Fernandes

TUANE FERNANDES
Fotógrafa da agência Farpa, Tuane Fernandes acompanhou em São Paulo os protestos pró-democracia, que terminaram em confrontos, no último domingo, dias após perder um familiar com sintomas de covid. Lutos e lutas, em texto e imagens.
Fotos: Tuane Fernandes / Farpa / Revista ZUM.
“O dia em que o morro descer e não for carnaval,/ ninguém vai ficar pra assistir o desfile final./ Na entrada rajada de fogos pra quem nunca viu./ Vai ser de escopeta, metralha, granada e fuzil (é a guerra civil.)”
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Wilson das Neves veio direto na minha cabeça quando as bombas começaram a estourar. É engraçado pensar que a retomada antifascista foi iniciada por uma torcida organizada. Engraçado, mas não surpreendente, afinal a luta política e social faz parte do DNA da Gaviões, e ser corintiano representa isso, vai muito além das arquibancadas. E, nas ruas, no domingo, algo importante a ser observado: além dos gaviões e de outras torcidas, era possível ver muita gente da periferia e entregadores. Brincamos na hora: ‘É a rappirevolution’.
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Vejo muitas críticas ao fato de irmos para as ruas protestar em época de pandemia, e, se você me perguntasse uns dias atrás, eu concordaria com isso. Mas hoje a realidade é outra. Como não ir às ruas se estão nos matando em casa? O fascismo avança, e vidas negras e periféricas, como sempre, são as primeiras a irem embora.
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Estive isolada mais de 70 dias, e foi complicado não trabalhar nesse período. Eu vivo de documentar, e não pude por diversos motivos. Mas a pandemia escancarou a desigualdade social (coisa que nunca foi segredo para mim), e nesse momento precisamos lutar com todas as armas e forças que temos. E eu precisei voltar às ruas.
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Ontem perdi uma pessoa muito amada da minha família. Esteve três dias na UTI com sintomas graves de covid, mas, por ser idosa, não teve nem a chance de ser testada. Vidas idosas e pobres importam? Somente para a família, parece. Vida que vira subnotificação. Vida minha. Vida que fez parte da minha vida. Vida que vai embora sozinha num leito de UTI. Família que fica isolada sem respostas e sem despedida. E o estado flexibiliza. Brinca. Então não, não podemos mais ficar quietos. Parem de nos matar e de brincar com nossas vidas. Abram alas, porque a revolta vai passar.”
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Tuane Fernandes iniciou sua carreira no fotojornalismo em 2016 e tem se dedicado a projetos ligados aos temas da democracia, igualdade de gênero e justiça social.  Suas fotografias já foram publicadas em veículos como Folha de S.Paulo, Carta Capital, National Geographic, VICE, entre outros. Integra o time dos fotógrafos da agência FARPA.

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